sábado, 14 de fevereiro de 2015

Homilia do VI Domingo Comum - (Mc 1,40-45)



O evangelho deste domingo começa afirmando que “um leproso chegou perto de Jesus”. Na realidade não foi o leproso quem chegou perto de Jesus e sim o Senhor quem chegou perto do leproso. Quem é este leproso? Todo homem marcado pelo pecado e que por isso perdeu a sua dignidade. Somos todos nós. Não é o homem quem vai ao encontro de Deus e sim Deus quem vem ao encontro dos homens.

Na realidade podemos afirmar que este evangelho é a síntese de toda a obra da redenção trazida por Jesus. Depois do pecado dos nossos primeiros pais perdemos a primeira veste e a nossa pele foi desfigurada pela lepra do pecado. Como afirma a primeira leitura, já não podemos habitar no acampamento, por isso fomos expulsos do paraíso, ficamos isolados da comunhão com Deus. Aqui está a grande consequência do pecado “ficar isolado e morar fora do acampamento”. 

A ideia do “morar fora do acampamento” tanto tem o sentido do paraíso perdido, da comunhão com Deus que foi rompida, do céu fechado para o homem, como também, podemos compreender a atitude de quem mora fora de si mesmo, na condição de homem dividido, que não consegue mais ter interioridade, espiritualidade, que vive fora de suas energias interiores, sem conseguir estabilizar a sua identidade. 

Lembro aqui de um personagem bíblico, Josué, que segundo o livro do êxodo (33,11) estava sempre na Tenda da Reunião, lugar do encontro com Deus, nunca se afastava desta tenda. Lembro também de Jacó que era um “homem tranquilo morando sobre tendas” (Gen 25, 27), mas lembro de Dina, filha de Jacó, que um dia se afastou da tenda (Gen 31,1) e foi abusada pelos siquemitas. Longe da tenda do encontro com o Senhor, fora do acampamento, não podemos encontrar tranquilidade, serenidade para dar sentido à vida. 

Podemos nesta liturgia meditar sobre a nossa “localização existencial cristã”. Quando Adão e Eva pecaram, se esconderam de Deus e ai o Senhor perguntou: “Adão onde estas?”. Onde estou? No acampamento ou fora dele? Estou andando a “esmo” como disse Satanás a Deus no livro de Jó? 

Mas um dia este homem leproso tem um encontro com Jesus, o Filho de Deus, que também saiu da Tenda do seu Pai no céu, não por que tenha pecado, mas saiu para vir ao encontro do homem pecador. Cristo se fez pecado para, assumindo o nosso pecado, nos livrar dele. É justamente isso que vamos encontrar no relato do evangelho. Um leproso está diante de Jesus, à criatura diante do criador, o doente diante do médico, a miséria diante da misericórdia, o desespero diante da esperança, o ódio diante do amor. Podemos imaginar aqui como deve ter sido o olhar contemplativo de Jesus sobre este homem. O artista ver a sua obra que havia criado bela, mas está desfigurada, quase não a reconhece mais. Mas ele não a rejeita, pelo contrário veio em busca dela, o bom pastor encontra a sua ovelha e sente por ela um profundo amor. Jesus tem o remédio certo para curar sua ovelha, para livrá-la da lepra e este remédio é a compaixão. 

Poderia ter curado o leproso apenas com o seu olhar, ou com sua palavra, mas fez muito mais do que isso, por que tudo para o amor é possível, o amor não se contenta com o mínimo, ele dar tudo, ele faz tudo e o amor e a compaixão de Jesus é enorme. E ai o Senhor “não perde tempo”, se precipita para o leproso, estende a mão e o toca, Ele quer sentir a espessura das feridas, sentir o resto de vida que aquele corpo dominado pelo pecado ainda tem. 

A Pureza carregada de compaixão toca na impureza e a compaixão faz com que a impureza seja destruída, faz com que a ordem da criação seja colocada mais uma vez em ordem e que o homem recupere a sua primeira veste, sua dignidade original. Orígenes diz que “ao estender a mão para tocar no leproso a lepra desapareceu; a mão de Jesus não encontrou a lepra e sim um corpo curado”. Vamos pensar assim: o amor de Jesus foi tão grande por aquele homem que no espaço entre o olhar e o tocar o mal desapareceu. São João Crisóstomo diz “não foi à mão do Senhor que foi contaminada pela lepra e sim o leproso é que foi purificado pela mão divina”. 

Pensemos em nós, em nossas impurezas, olhemos para Jesus e deixemos que ele nos olhe, nos ame com o seu olhar e nos envolva com a sua compaixão e destrua também “as lepras” que ainda insistem em permanecer em nossas vidas. Com certeza ele o fará, por que foi para isso que Ele veio.

Pe. Paulo Sérgio Gouveia
vigário da catedral diocesana
Diocese de Campina Grande

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