A liturgia deste domingo nos coloca diante da realidade do tempo, “o tempo está abreviado” diz São Paulo e Jesus diz no evangelho: “o tempo já se completou”. Aqui encontramos a importância do tempo e a sua provisoriedade. Ele passa, ele também é vaidade, como diz o autor do Eclesiastes, mas é nele que se cumpre a obra da redenção.
Quando Deus criou o céu e a terra ele criou o tempo e o espaço. Ele criou o tempo cronológico. É no tempo e no espaço que o homem é chamado a realizar a sua vocação. O tempo é um dom de Deus que deve ser empregado bem, mas ele passa. Mas, mesmo sendo passageiro, o tempo é importante, pois é nele que o homem é chamado a viver a sua história e esta história é a história do amor de Deus pelo homem. Podemos afirmar que é a história da paixão de Deus pela sua criatura. É no tempo que Deus “faz de tudo” para nos salvar, que ele “age com todas as suas forças” para que acolhamos a sua Palavra e saibamos empregar vivendo uma nova vida. Mais se o tempo é passageiro, o homem é chamado a ser eterno. Por isso, Jesus que é eterno entrou no tempo para anunciar a Palavra que é eterna e assim eternizar o homem.
Deus realiza esta maravilha transformando o tempo de cronológico para kairológico (tempo da graça). E isto acontece quando o homem aceita a intervenção de Deus no mundo. A conversão do homem ao evangelho é algo tão prodigioso que não apenas transforma o homem, mas muda o tempo, este se torna momento da graça de Deus. Faz com que este de passageiro se torne eterno. Isto é, faz com que o homem que peregrina no tempo (cronológico) conduzido pela caridade entre na eternidade (kairologico).
Para o cristão é verdadeira a palavra de Paulo “a figura deste mundo passa”. Santo Agostinho dirá que “somos peregrinos nesta vida”. Não é apenas a figura deste mundo que passa, o homem como peregrino também passa. Mais contemplando a figura o homem descobre a eternidade, gemendo sob o peso do provisório o homem anseia pelo eterno. Por isso, há uma diferença substancial entre o “mundo” e o homem redimido em Cristo: enquanto que as coisas passam no sentido de que se tornam caducas e desaparece, o homem ao passar por este mundo unido a Cristo não desaparece, mas é renovado e “capacitado” para a eternidade.
A Palavra de Deus hoje nos ajuda a refletir sobre a provisoriedade das coisas. Não no sentido negativo, como se elas não fossem importantes, mas no sentido positivo, de que elas são meios para nos proporcionar, ao entardecer da nossa vida algo muito melhor. Santo Agostinho dirá que não devemos fruir do mundo. “Fruir é ligar-se a uma coisa apenas pelo prazer que ela me proporciona”, mas continua ele: “Usa tão somente deste mundo, não queiras fruir dele e, desta forma, por meio de coisas temporais hás de conquistar os bens eternos”. Mas isto só será possível quando houver a conversão. É preciso converter-se e acreditar no evangelho. Não basta viver por viver.
Mais uma vez escutemos Santo Agostinho: “Faze uso do mundo, não consintas que ele te prenda: porque entraste nele, estás em viagem: viestes para sair logo, não para permanecer”.
Na realidade como seria interessante se nós os católicos meditássemos sobre esta frase de Paulo “a figura deste mundo passa” e tivéssemos a coragem de nos convertermos à simplicidade do evangelho. Quantas energias gastas no estrelismo, na vaidade, no desejo de pertencer a uma cúria, seja romana ou diocesana, quantas preocupações com paramentos, com títulos, com cargos mesmo sabendo que ao assumi-lo não contribuirá em nada para o processo de evangelização. Quantas mentiras com o único intuito de se promover. E o mais angustiante é quando ouvimos “esse individuo foi promovido para ser removido”. Onde fica o amor a Igreja?
A figura deste mundo passa, a única coisa que fica é a nossa autenticidade, simplicidade e fidelidade ao evangelho. A única coisa que fica é a verdade, mas às vezes penso que a verdade esta tão longe de nós, homens da Igreja. Diante de certas situações vividas na Igreja às vezes me pergunto: será que conhecemos o evangelho? Será que não estamos trocando o eterno pelo provisório? Será que não estamos nos apegando ao que passa esquecendo o que não passa?
Pe. Paulo Sérgio Gouveia
vigário paroquial da catedral diocesana
Diocese de Campina Grande
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